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Mao3D – Nem sempre é possível fazer a protetização infantil

Maria Elizete Kunkel

30 de julho de 2016

Amputações, Impressão 3D, Movimento maker, Prótese, Reabilitação

As próteses de membro superior produzidas pelo Programa Mao3D, através da tecnologia de impressão 3D, têm como base os modelos livres disponibilizados pela e-Nable. Nós sempre realizamos modificações no modelo de acordo com as preferências do usuário, visando personalizar a prótese. Essas próteses são classificadas como mecânicas, em que o movimento de abrir e fechar a mão é acionado pela articulação mais próxima do coto, seja a articulação do punho ou do cotovelo. O coto é a parte remanescente de um membro após uma amputação. Nos casos de indivíduos que nascem sem parte do membro superior, o coto é a região malformada que não se desenvolveu.

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A Thabata Ganga, colaboradora do Mao3D, já escreveu um artigo detalhando os modelos de próteses que podem ser fabricados por meio da impressão 3D. Nesse artigo, ela também aborda como é feita a seleção do modelo ideal com base no nível de amputação do usuário que utilizará a prótese.

Apesar da existência de uma ampla variedade de modelos, infelizmente ainda há casos em que a protetização infantil não é viável. Isso foi o que ocorreu com o Lucas, um paciente recentemente acompanhado pelo Mao3D.

O Lucas, de apenas 4 anos, sofreu a amputação de uma parte do braço devido a um erro médico ocorrido quando ele tinha apenas 30 dias de vida, em um hospital público de São José dos Campos. O erro médico resultou em gangrena, o que levou à amputação do braço do Lucas logo abaixo da articulação do cotovelo. Nesses casos, não existem próteses comerciais disponíveis que possam atender às necessidades específicas, e geralmente a criança deve esperar até a idade adulta para receber sua primeira prótese mecânica por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Todas as crianças que recebem atendimento pelo Programa Mao3D são submetidas a uma triagem inicial no Centro de Reabilitação Lucy Montoro. No caso específico de Lucas, durante a triagem, a equipe de profissionais de saúde responsável por seu cuidado concluiu que ele era inadequado para o processo de protetização, principalmente devido à sua tenra idade e à presença de uma amputação com uma porção óssea significativamente curta localizada imediatamente abaixo da articulação do cotovelo.

Quanto mais próxima a extremidade do coto estiver da articulação, mais complicado se torna o processo de protetização. No entanto, não há um critério definitivo para determinar se é possível ou não realizar a protetização. Por isso, no Mao3D, decidimos tentar. Iniciamos o processo de confecção da prótese do Lucas em paralelo ao programa de reabilitação. Durante a reabilitação, ele participou de uma série de atividades com fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais para se preparar tanto psicologicamente quanto fisicamente para receber a prótese.

A primeira etapa da produção da prótese consiste na obtenção das medidas. No primeiro contato com o Lucas, pudemos constatar detalhes que geralmente não podem ser vistos em uma foto. Apesar de ele apresentar uma parte visível do antebraço abaixo da articulação do cotovelo, ao realizar um exame mais detalhado, observamos que a parte óssea é muito menor do que aparenta. Isso ocorre porque a maior parte da ponta do antebraço, ou seja, seu coto, é composta apenas por tecido mole. Isso já indicava que seria desafiador realizar a protetização, uma vez que a extremidade precisa ser rígida o suficiente para permitir o encaixe da prótese.

A obtenção de medidas precisas em um braço infantil de apenas 4 anos de idade é uma tarefa desafiadora, pois a criança, assim como é típico nessa faixa etária, possui uma natureza inquieta. A equipe do Programa Mao3D se empenhou em criar um ambiente lúdico, utilizando técnicas como a brincadeira de estátua, contação de histórias e canções, a fim de facilitar a obtenção das medidas necessárias. Por fim, tentamos três métodos: 1) Medição direta com fita métrica; 2) Fotogrametria (tiramos uma série de fotos para reconstrução em 3D); 3) Molde de gesso; e 4) Escaneamento a laser, com a ajuda da Empresa Rellevo Engenharia de São José dos Campos.

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Imagens autorizadas pelo responsável.

Durante todo o processo, foi necessário garantir a imobilidade do braço para a obtenção das medidas precisas. No entanto, devido a restrições práticas, optamos por utilizar apenas o método de medição direta com uma trena métrica para determinar o tamanho adequado da prótese. Para a confecção da prótese do Lucas, escolhemos como base o modelo Unlimbited ARM da e-Nable, em que a parte de encaixe da prótese é moldada diretamente no coto utilizando material aquecido em banho-maria.

Lucas foi envolvido em todas as etapas da produção da prótese, desde a seleção das cores até a escolha do modelo com o escudo do Capitão América impresso diretamente na mão. A Terapeuta Ocupacional Patricia Aby, do Mao3D, orientou-nos ao longo de todas as fases do processo de moldagem e teste da prótese. A modelagem e impressão foram realizadas pela Ana Paula Cano e Renan Butkeraites, respectivamente. Utilizamos uma impressora 3D da Sethi3D e filamento PLA da 3DProcer para a impressão da prótese. Além disso, contamos com acessórios doados pela Klimm Odontologia e pela empresa Gtmax3D para a montagem da prótese.

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Imagens autorizadas pelo responsável.

Após a conclusão da prótese do Lucas, procedemos a uma série de testes iniciais e constatamos que ela se ajustava perfeitamente ao seu tamanho. No entanto, devido ao comprimento limitado do seu coto, ele não possuía extensão suficiente para utilizar a prótese e realizar a flexão do cotovelo.

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Fonte: (Ottobock, 2015)

A equipe do Mao3D, então, realizou uma reunião com a equipe de saúde do Lucy Montoro e o médico responsável pelo acompanhamento do caso do Lucas. Nessa reunião, o médico concluiu que não seria viável realizar a protetização para o Lucas. Essa notícia deixou todos nós profundamente tristes, uma vez que nosso principal objetivo era possibilitar a protetização para ele. Até o momento, em casos de amputação tão curta, logo abaixo do cotovelo, existem apenas duas outras opções disponíveis:

1. Utilização de uma prótese mecânica acionada por meio de tirantes, que aproveita o movimento do outro ombro. No entanto, esse tipo de acionamento requer um treinamento complexo e não é recomendado para crianças pequenas, pois, se não for executado corretamente, pode acarretar lesões corporais a longo prazo. Além disso, o sistema de tirantes utilizado para acionar a prótese e bloquear o cotovelo limita o conforto de uso, uma vez que aumenta consideravelmente a temperatura da região (Da Luz, 2010), conforme ilustrado na figura abaixo.

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2. Outra opção é o uso de uma prótese mioelétrica. Esse tipo de dispositivo é acionado pelo movimento de determinados músculos, que controlam motores responsáveis por abrir e fechar a mão, sendo alimentado por baterias. No entanto, trata-se de um sistema complexo e, atualmente, não há no mercado nacional um modelo de prótese mioelétrica adequado para uso infantil. Os modelos disponíveis são importados, apresentam peso elevado e possuem um custo alto, chegando a valores de até R$ 300.000,00. Apesar disso, estão sendo desenvolvidos alguns modelos de próteses mioelétricas infantis por meio da impressão 3D pela e-Nable, mas ainda não estão prontos para utilização.

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Fonte: e-Nable

Atualmente, estamos em fase de pesquisa e desenvolvimento de um modelo mais adequado de prótese mioelétrica para crianças (Ganga, 2016). Tanto a equipe do Mao3D quanto a comunidade e-Nable ainda não podem oferecer uma solução segura e funcional para casos como o do Lucas. Cada caso ao qual nos dedicamos para ajudar nos proporciona valiosos aprendizados. Ainda há muitas questões em aberto, mas acreditamos que somente por meio da tecnologia e da inovação podemos encontrar soluções que auxiliem crianças que nasceram sem um membro superior ou que tenham passado por amputações. Além disso, a participação de profissionais da área da saúde é fundamental em todo o processo de protetização.

Referências: 

  • da Luz SCT, et al. Adaptação à prótese híbrida de extremidade superior: estudo termográfico de um caso.”Fisioterapia e Pesquisa. 17.2 (2010): 173-177.

  • Ganga, TA. Análise computacional da resistência mecânica de uma prótese de membro superior feita por manufatura aditiva. Trabalho de conclusão de curso de Engenharia Biomédica. Unifesp. 2016.

  • Ottobock, Manual de instruções para usuário de próteses exoesqueléticas de membro superior. Otto Bock HealthCare GmbH, Duderrstadt, Alemanha. 2015.

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